A Geometria da Bandeira do Brasil

Você sabia que a bandeira do Brasil possui medidas oficiais que são determinadas e amparadas por lei? A bandeira nacional, assim como outros símbolos nacionais (hino nacional, armas nacionais, e o selo nacional), são padronizados de acordo com as especificações contidas na Lei nº 5 700 de 1º de setembro de 1971.

Para comemorar os 200 anos da independência do Brasil do melhor jeito matemático, vamos construir uma bandeira de nosso país utilizando régua e compasso.

A atual bandeira do Brasil foi adotada através do decreto nº 4, de 19 de novembro de 1889 (data conhecida como o dia da bandeira). O modelo foi criado por Raimundo Teixeira Mendes, com a colaboração de Miguel Lemos. Manuel Pereira Reis, professor catedrático em Astronomia pela Escola Politécnica ficou responsável pela posição das estrelas no círculo azul (dando-o a característica de esfera celeste). O desenho foi feito por Décio Vilares.

Antes do decreto nº 4, o Brasil tinha como bandeira oficial a Bandeira Imperial do Brasil (1822 – 1889), que foi oficializada após a declaração da independência do Brasil, por isso é considerada oficialmente a primeira bandeira nacional brasileira.

Figura 1: Bandeira Imperial do Brasil (1822 – 1889)

Com a Proclamação da República em 15 de novembro de 1889 decidiram erguer uma nova bandeira mostrando a nova fase do Brasil.

Figura 2: Bandeira provisória da República

Parece que já vi este desenho em algum lugar… “Talvez” por conta disso, decidiram trocar o modelo da bandeira para o qual nós conhecemos hoje.

Figura 3: Bandeira atual do Brasil

Mas esse site não é um site de história do Brasil, e sim de matemática então, vamos ao que interessa, vamos construir uma bandeira do Brasil utilizando instrumentos de Desenho Geométrico e as medidas oficiais.

O artigo 4º do capítulo II da Lei 5 700 diz que a bandeira do Brasil, confeccionada em tecido para locais públicos e privados, deve ser feita de acordo com os seguintes tipos: “tipo 1, com um pano de 45 centímetros de largura; tipo 2, com dois panos de largura; tipo 3, três panos de largura; tipo 4, quatro panos de largura; tipo 5, cinco panos de largura; tipo 6, seis panos de largura; tipo 7, sete panos de largura.” Dessa forma, utilizando uma linha diagonal, os diversos tamanhos se manterão na proporção estabelecida pelo decreto.

Figura 4: Proporção entre os tecidos utilizados na confecção da bandeira

E agora nós podemos reproduzir nossa bandeira do Brasil desde que mantenhamos as devidas proporções (se quisermos fazer corretamente). Para isso, acompanharemos o artigo 5º para construirmos nossa bandeira em uma folha sulfite.

No próprio site do planalto temos um referencial quanto as medidas oficiais da bandeira do Brasil.

Figura 5: Desenho modular da bandeira nacional

Trataremos de cada parte do desenho de maneira isolada, seguindo a ordem dos tópicos apresentados no artigo 5º.

Art. 5º A feitura da Bandeira Nacional obedecerá às seguintes regras

I – Para cálculo das dimensões, tomar-se-á por base a largura desejada, dividindo-se esta em 14 (quatorze) partes iguais. Cada uma das partes será considerada uma medida ou módulo.

É importante compreendermos que este “módulo” faz referência a unidade de medida utilizada, podendo ser centímetros, metros, e se for o caso, milímetros ou quilômetros. Neste caso, como construiremos a bandeira numa folha de sulfite, utilizaremos como unidade os centímetros.

II – O comprimento será de vinte módulos (20M).

Desta forma, seguindo os itens I e II, construiremos o retângulo (verde) que compõe o fundo de nossa bandeira. Esta construção poderá ser realizada utilizando régua e esquadros ou trançando um ângulo reto nas extremidades do segmento.

Figura 6: Construção do retângulo 20 cm x 14 cm

O verde da bandeira, dentre seus muitos significados, é uma recordação à família de Bragança, a filiação com a França e o estandarte dos Bandeirantes.

III – A distância dos vértices do losango amarelo ao quadro externo será de um módulo e sete décimos (1,7M).

O losango amarelo fica centralizado com relação ao retângulo, dessa forma, para facilitar o processo de construção de nossa bandeira, podemos ligar os pontos médios (mediatriz) dos lados paralelos para obtermos o centro da bandeira e segmentos de base para posicionar os vértices do losango.

Figura 7: Construção das mediatrizes

Como os vértices do losango precisam distar um módulo e sete décimos das laterais do retângulo (no caso 1,7 cm), basta transferirmos esta medida com o compasso para as mediatrizes.

Figura 8: Transferência da medida 1,7 cm para as mediatrizes.
Figura 9: Construção do Losango.

O losango na bandeira, em particular, é a representação da mulher na posição de mãe, esposa, irmã e filha. Sua cor amarela faz alusão ao período imperial, recordando às famílias nobres de Habsburgo, Castela e Lorena a que pertencia D. Leopoldina, esposa de D. Pedro I.

O retângulo e o losango mantiveram as cores (tonalidades) da bandeira imperial, mostrando que a nova bandeira ainda carrega o legado da era imperial, o que nos chama a atenção para o fato de não existirem referências oficiais quanto a tonalidade de cada cor, mas baseado na maioria das bandeiras que encontramos pela internet, as cores mais próximas às “oficiais” são as seguintes:

Figura 10: Cores da bandeira do Brasil com código hexadecimal.

IV – O círculo azul no meio do losango amarelo terá o raio de três módulos e meio (3,5M).

Figura 11: Construção do círculo de raio 3,5 cm.

O azul do círculo remonta a nacionalidade lusitana e homenageia a Padroeira do Brasil, Nossa Senhora Aparecida.

A inclusão das estrelas (que não estão organizadas de qualquer maneira) sobre o círculo o transforma em uma esfera celeste. Uma esfera celeste é uma representação simplificada do céu, onde consideramos que todas as estrelas estão a uma mesma distância da Terra, como se estivessem contidas na superfície de uma esfera (bola) e a Terra estivesse em seu centro. São usadas para orientação e localização de objetos no céu. Faz sentido ao considerarmos o que está escrito no inciso 1 do artigo 3º:

Figura 12: Exemplo de uma esfera celeste.

§ 1° As constelações que figuram na Bandeira Nacional correspondem ao aspecto do céu, na cidade do Rio de Janeiro, às 8 horas e 30 minutos do dia 15 de novembro de 1889 (doze horas siderais) e devem ser consideradas como vistas por um observador situado fora da esfera celeste.

Claro que o “céu” representado na bandeira é algo idealizado, visto que algumas estrelas estão posicionadas de forma inconveniente. Contudo, a bandeira brasileira é única a apresentar uma ilustração completa com relação aos corpos celestes.

Já que estamos tratando das estrelas contidas na bandeira brasileira, vale ressaltar de que não conseguirei desenhá-las sobre a bandeira que estamos construindo, pois elas possuem tamanhos extremamente pequenos e variados, já que cada tamanho serve para representar seu brilho. Observe o 9º tópico:

IX – As estrêlas serão de 5 (cinco) dimensões: de primeira, segunda, terceira, quarta e quinta grandezas. Devem ser traçadas dentro de círculos cujos diâmetros são: de três décimos de módulo (0,30M) para as de primeira grandeza; de um quarto de módulo (0,25M) para as de segunda grandeza; de um quinto de módulo (0,20M) para as de terceira grandeza; de um sétimo de módulo (0,14M) para as de quarta grandeza; e de um décimo de módulo (0,10M) para a de quinta grandeza.

Se fôssemos adaptar as grandezas a nosso padrão de medida, cada estrela seria construída em circunferências de raio: 0,15 cm; 0,125 cm; 0,10 cm; 0,07 cm e 0,05 cm. Medidas extremamente pequenas, não dá nem para rotacionar o compasso sobre a folha. Porém, mostrarei como podemos desenhar estrelas (de 5 pontas) com régua e compasso.

Primeiramente devemos construir uma circunferência de centro O de raio qualquer utilizando o compasso. Após isso, traçamos um segmento de reta destacando o diâmetro desta circunferência que passa pelos pontos A e B.

Figura 13: Primeiros passos – Estrela de 5 pontas com régua e compasso.

Feito isso, devemos traçar um raio perpendicular ao diâmetro até o ponto . Neste caso poderemos utilizar esquadros ou encontrar a mediatriz do segmento também.

Figura 14: Raio perpendicular ao diâmetro.

Agora será necessário encontrar o ponto médio de {\bar{OB}}  (ou {\bar{AO}}), criando assim o ponto M.

Figura 15: Raio perpendicular ao diâmetro.

Destacamos agora o segmento {\bar{CM}}. Este segmento será de tamanha importância para a criação da estrela. Posteriormente, deveremos transferir esse comprimento para o diâmetro, mantendo a ponta seca do compasso em M, criando o ponto D.

Figura 16: criação do segmento.
Figura 17: Marcação do ponto D. Transferência do comprimento CD para a circunferência no ponto E com compasso.

A partir do ponto E e utilizando o comprimento CD marque pontos sequenciais sobre a circunferência. A partir de agora, omitirei os pontos A, B, C, D, O e M e todos os pontos que marcarei agora serão marcados na forma {E_{n}} , onde o índice {n} identificará cada ponto E.

Figura 18: Pontos sobre a circunferência.

Você verá que não será possível marcar mais do que 5 pontos sobre a circunferência utilizando este comprimento. Agora, dependendo da forma como ligarmos esses pontos, criaremos um pentágono ou a estrela de cinco pontas.

Figura 19: Ligação das diagonais de um pentágono regular.
Figura 20: Finalização – Estrela de 5 pontas.

Observe que são detalhes difíceis de se reproduzir em circunferências de diâmetro muito reduzido, então podemos resolver nosso problema desenhando as estrelas sob a bandeira utilizando algum gabarito ou molde pronto.

Agora apresentarei quais estrelas representam quais estados e quais constelações elas formam (ou fazem parte), lembrando que não há relações entre o tamanho, brilho e posicionamento da estrela e o tamanho dos estados, o critério utilizado foi a posição das estrelas no céu e a sequência geográfica dos estados.

Tabela 1: Correspondência – Estado e Constelações.

Vale ressaltar que a única estrela acima da faixa branca, ao contrário do que muitos pensam, não representa o Distrito Federal, mas sim o Pará. Talvez esse equívoco aconteça já que estamos habituados a falar que o Brasil possui 27 estados mais o Distrito Federal, causando uma separação desse último dos demais.

E continuando a tratar do círculo azul e de sua característica celeste, um dos elementos da bandeira que dá a perspectiva esférica a ele é a faixa branca com o inscrito “Ordem e Progresso”.

V – O centro dos arcos da faixa branca estará dois módulos (2M) à esquerda do ponto do encontro do prolongamento do diâmetro vertical do círculo com a base do quadro externo (ponto C indicado no Anexo nº 2).

VI – O raio do arco inferior da faixa branca será de oito módulos (8M); o raio do arco superior da faixa branca será de oito módulos e meio (8,5M)

VII – A largura da faixa branca será de meio módulo (0,5M).

Figura 21: Gabarito do desenho da faixa.
Figura 22: Inclusão da faixa sobre a bandeira.

Sem muitos segredos para a construção da faixa, não é verdade?

As letras também possuem tamanhos e posições específicas. Veja:

VIII – As letras da legenda Ordem e Progresso serão escritas em côr verde. Serão colocadas no meio da faixa branca, ficando, para cima e para baixo, um espaço igual em branco. A letra P ficará sôbre o diâmetro vertical do círculo. A distribuição das demais letras far-se-á conforme a indicação do Anexo nº 2. As letras da palavra Ordem e da palavra Progresso terão um têrço de módulo (0,33M) de altura. A largura dessas letras será de três décimos de módulo (0,30M). A altura da letra da conjunção E será de três décimos de módulo (0,30M). A largura dessa letra será de um quarto de módulo (0,25M).

Interessantíssimo o quão preciso a uma bandeira de um país precisa ser para estar nas medidas oficiais, não é mesmo? A última ressalva a ser feita é quanto ao outro lado da bandeira (folha) e está no décimo tópico:

X – As duas faces devem ser exatamente iguais, com a faixa branca inclinada da esquerda para a direita (do observador que olha a faixa de frente), sendo vedado fazer uma face como avêsso da outra.

Figura 23: Bandeira do Brasil com Régua e Compasso – sem detalhes (estrelas e a frase “Ordem e Progesso”

Dessa forma, a bandeira tem que ser a mesma quando vista de frente ou de costas.

A primeira pessoa a trabalhar com essa matemática foi D. Flora Simas de Carvalho, que costurou a primeira bandeira oficial após o decreto de 1889. A bandeira sendo bordada pela família de Dona Flora é retratada pelo quadro A Pátria, de 1919, do pintor Pedro Bruno, que se encontra hoje no Museu da República no Rio de Janeiro.

Figura 23: Obra “A Pátria” de Pedro Bruno

É previsto por lei, também, alterações em nossa bandeira caso algum estado seja integrado ao país, dessa forma será acrescentada mais uma estrela à esfera celeste. Isso vale também nos casos em que algum estado se desvincule, então a estrela, a qual o representava, será removida da bandeira.

E por aqui encerramos esta interessante participação da matemática na história de nosso país. E aí, já sabia de tudo isso? Já sabia como construir as partes da bandeira com régua e compasso? Comente aí abaixo e compartilhe este artigo com seus amigos!

One thought on “A Geometria da Bandeira do Brasil

  • Setembro 5, 2022 at 3:51 pm
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    A matemática está em tudo mesmo professor!!! Que legallll 🙂

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